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  • José Leonídio

LEMBRANÇAS DE UM TEMPO QUE JÁ PASSOU, OU NÃO?

Acho que era o fim do inverno e princípio da primavera de 1996. Não estava nas pradarias, nem nas montanhas de Bento Gonçalves, Gramado, Canela, Garibaldi ou Flores da Cunha, pelo contrário, estava no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.

O pôr do Sol no Guaíba me encantava. Estava no reservado aos passageiros que pegariam o voo com destino ao Rio de Janeiro. Retornava a minha cidade Natal, depois de visitar o Hospital das Clínicas de Porto Alegre.

Atrás de mim, um casal, que, de tão juntos, pareciam um só. À minha frente, à direita, um grupo que parecia ser um conjunto musical por carregar com todo carinho seus instrumentos musicais.

O vozerio que vinha do casal começou a me chamar atenção:


- É ele!

-Não, não é não!

Tenho certeza é ele!

-Não, não é não, acha que estaria aqui junto a nós?

-Tenho certeza, é ele sim, e gostaria tanto de tirar uma fotografia com ele!

- Você não acha que podemos estar cometendo um terrível engano, e com que cara ficaríamos depois?


- Amor, é a maior recordação que posso levar de nossa lua de mel, uma fotografia de nós dois e ele, que é quem mais amo depois de você.


Diante de tais argumentos, o recém-casado (não me perguntem o nome, não fui tão indiscreto) foi direto ao grupo.


- Me desculpem, acabei de me casar, estou indo para lua de mel no Rio de Janeiro, e minha esposa acha que você é o Gilberto Gil, e gostaria de tirar uma fotografia de nós dois com você, perdoe-me, é porque ela ama tanto o Gilberto Gil que até acho que o está confundindo com ele.

- Não, ela tem razão: sou eu mesmo!

- Como assim, ela não está se confundindo?

- Não está não! Cadê sua esposa?

- Está ali atrás!

- Vá lá e traga até nós!

Assim foi dito, assim foi feito!


Em poucos minutos estavam juntos, o casal, Gilberto Gil e sua banda.

Eu?

Era somente um mero espectador.

Quando a recém-casada se encontrou com Gilberto Gil, a abraçou, e ele, com aquele seu jeito leve, livre e solto baiano de ser, abraçou-a e a trouxe para junto de si, tendo todo o cuidado de chamar também para se integrar seu recém-marido.


Tiraram todas as fotografias que puderam. Ao fim, enquanto aguardávamos a chegada do avião, ele pegou seu violão e cantou como presente de casamento aos dois, aquela que ela achava a canção mais bonita dele, DRÃO.


Os dois se debulhavam em lágrimas com aquela apresentação única, talvez o maior presente de casamento que tiveram. Ao fim o avião chegou, eles se despediram. Ela com a alegria estampada por todos os poros. Ele, sem saber, lhe dera o maior presente que poderia lhe oferecer, na sua lua de mel.

Gil, o Gilberto Gil, embarcou com seu sorriso baiano de ser, sem ter a noção do quanto marcaria a vida daquele casal.


Eu, um intruso, um abelhudo, que com minha indiscrição, hoje, posso lhes contar 25 anos depois o que vi, o que presenciei naquela tarde de quase primavera no aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre.


O casal, não sei quem são, nunca mais os vi, porém tenho certeza que ao ler estas linhas indiscretas se lembrarão do que estou relatando.

Gil, Gilberto Gil, acho que na sua humildade de ser, talvez nem se lembre do quanto fez feliz aquele casal naquela tarde de quase Primavera no aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre.


Não importa, Gil, é assim mesmo, vai caminhando e deixando seu sorriso, sua sabedoria e, o mais importante, seu acolhimento físico e espiritual, estrada afora.

Obrigado por poder estar lá, poder relatar e ver que a vida nos presenteia com os melhores momentos, sem que percebamos.



Obrigado ao casal, obrigado Gil.

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