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José Leonídio

VARANDAS

Varandas vazias, vazias varandas. Varandas onde as famílias se reuniam e de onde contemplavam o universo que se movimentava fora dos limites dos seus muros. Varandas praças de juras de amor eterno, canto das mães amamentando seus filhos. Varandas onde nossas avós faziam seus crochês ou tricôs, enquanto contavam antigas fábulas aos seus netos.


As varandas se multiplicaram, se verticalizaram, foram sobrepostas umas às outras, dezenas delas, porém, se aumentaram em número, perderam o encanto que atraia a todos que ali habitavam. O calor humano despertado por aquele cantinho da casa, onde andorinhas penduradas na parede pareciam querer dizer que ali era seu verdadeiro ninho.


Jardineiras muitas vezes eram o seu limite entre a casa e a rua. As flores nas mesmas davam-nos o encanto, a beleza e porque não as boas-vindas a quem chegava. Ali tudo era conversado, tudo era discutido, grandes decisões eram tomadas. Varandas, o ponto no qual recebíamos os amigos para uma conversa informal, onde nos aquecíamos com a energia solar, nos tempos frios ou quando de convalescença.


Era passando por elas que chegávamos ao interior das casas, ou seja, era passagem obrigatória para o núcleo familiar. Mesinhas de ferro, cadeiras à sua volta, cartas de baralho distribuídas aos participantes do jogo de sueca de buraco. Em outras ocasiões as peças da dama ou do dominó. E, para os mais sofisticados, o xadrez.


Como sinônimo de varanda, aconchego, união, congregação, confessionário ou mesmo testemunha de sonhos que se realizaram e de amores que se eternizaram. Gerações e gerações atravessaram seus espaços, se acolheram da chuva, se encolheram de medo dos raios e trovões das intempéries.


O tempo não tem passado, não tem costas, ele só possui a visão do horizonte que está à sua frente. É inexorável, o tempo evolui com a visão do progresso, e o progresso é como um grande trator que vai passando por cima das lembranças acumuladas. Construímos no passado a estrada do presente e do futuro. No entanto, o que ficou para trás quase sempre desaparece ou fica numa memória remota.


Em determinadas ocasiões o passado volta ao presente, mas de uma forma tão distorcida, que não tem mais a importância daqueles momentos vividos. São visões e interpretações de quem as ouviu e tirou suas conclusões. A modernidade traz no seu lanço a poda de valores que muitos acham que não tem mais espaço nos dias de hoje.


Varandas vazias, vazias varandas. Hoje não mais são o ponto de encontro, não entram mais nas casas por elas, sua verticalização, tirou seu aconchego, seu calor, sua missão quase que espiritual de união. As varandas passaram a ser o fim das casas, e não o início. São sós, o único calor. Na maioria delas, é a do sol que teima em aquecê-las pela manhã ou à tarde.


Quando olhamos para as inúmeras varandas dos edifícios, percebemos o vazio, são raros aqueles onde conseguimos enxergar a presença do calor humano.


Nelas habitam plantas, que floram e lhes dão beleza, às vezes a presença de um animal, um cão ou um gato, que passam horas olhando o movimento abaixo.


As varandas estão vazias, nos recolhemos ao interior das casas, nos isolamos, preenchemos nosso tempo nas redes sociais, assistindo séries, passamos a ser seres antissociais, ermitãos dentro de nossas cavernas de concreto.


Conversamos através das ondas sonoras transmitidas pelos celulares, notebooks etc.


Todo o romantismo, o aconchego que nos possibilitavam as antigas varandas, se ausentou. Hoje estão vazias, procuro incessantemente um rosto, um movimento, nada vejo. Varandas apagadas, inertes. O horizonte está a sua frente, mas ninguém o admira. Varandas vazias, vazias varandas, é como se fosse dado toque de recolher e aos núcleos sociais só fosse permitido circular no interior das casas. Viramos ermitãos de nós mesmos.


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